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Toda história tem dois lados...

Massacre do Carandiru: A Ferida Aberta da Violência de Estado no Brasil

Publicado em 02 de outubro de 2025 · Por Rodrigo Pontes

Registro do Massacre do Carandiru em 1992

Registro histórico do Complexo Penitenciário do Carandiru, palco da tragédia de 1992.

Em 2 de outubro de 1992, o Brasil foi marcado por uma das maiores tragédias de sua história recente. Naquela tarde, a Polícia Militar de São Paulo invadiu o Pavilhão 9 da Casa de Detenção, mais conhecida como Carandiru, e matou 111 presos em menos de uma hora de operação. Nenhum policial morreu. O massacre se tornou um símbolo global da violência estatal, da crise prisional brasileira e da impunidade que atravessa as décadas. Até hoje, a data é lembrada como um alerta sobre os limites da democracia diante da brutalidade institucional.

Do Presídio à Chacina

A Casa de Detenção do Carandiru foi inaugurada em 1920 para ser um modelo de modernidade penal. No entanto, ao longo do tempo, tornou-se sinônimo de degradação. Em 1992, abrigava quase 7 mil presos em condições desumanas, sem assistência adequada, com superlotação e violência cotidiana. O Pavilhão 9, que deveria receber presos provisórios ou de menor periculosidade, era um dos locais mais tensos do complexo. Uma briga entre dois detentos por dívida interna se transformou em rebelião. A PM foi acionada, e, sob comando do coronel Ubiratan Guimarães, decidiu pela invasão. O resultado: 111 mortos, muitos deles executados à queima-roupa, e uma ferida aberta na história do país.

Impactos e Narrativas em Disputa

A versão oficial sustentou que a operação foi em legítima defesa, mas os relatos de sobreviventes descrevem um cenário de execução sumária: presos desarmados foram mortos mesmo após se renderem. A perícia confirmou mais de 500 disparos dentro do pavilhão, e muitos corpos tinham múltiplos tiros. A repercussão foi imediata: jornais internacionais, como o Washington Post, denunciaram a brutalidade policial, enquanto a Anistia Internacional classificou o episódio como chacina. Mais do que uma tragédia isolada, o massacre escancarou a aceitação da violência de Estado como método de controle social. Um de seus efeitos mais duradouros foi a fundação, em 1993, do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção que nasceu da necessidade de organização dos presos após o trauma coletivo.

Da Impunidade à Memória

O percurso judicial foi marcado por lentidão e reviravoltas. Em 2001, o coronel Ubiratan foi condenado a 632 anos de prisão, mas em 2006 foi absolvido. Entre 2013 e 2014, dezenas de policiais foram condenados pelo júri popular, apenas para verem suas penas anuladas em 2016. Em 2023, o Supremo Tribunal Federal restabeleceu as condenações, mas em 2024 a Justiça de São Paulo extinguiu as penas com base em indultos presidenciais — decisão contestada nacional e internacionalmente. Paralelamente, o complexo prisional foi demolido, e em seu lugar surgiu o Parque da Juventude, um espaço de lazer e cultura. Ainda assim, o Carandiru permanece vivo na memória coletiva, lembrado em livros, filmes e movimentos sociais como a prova de que a violência estatal não traz ordem, mas sim mais desordem e desigualdade.

Trinta e três anos depois, o Massacre do Carandiru continua sendo um dos maiores símbolos da violência de Estado e da cultura da impunidade no Brasil. Ele mostra que a justiça falha quando se trata de responsabilizar agentes do poder público e que as feridas abertas pela violência institucional não cicatrizam facilmente. Relembrar o Carandiru não é apenas revisitar o passado, mas reafirmar o compromisso com os direitos humanos, a democracia e a necessidade de um sistema prisional mais justo e humano.

✍️ Artigo escrito por Rodrigo Pontes ·